quinta-feira, 17 de maio de 2007

O pecado original da mídia...



O pecado original da mídia:
O roteiro de A Guerra dos Mundos


Orson Welles (1915-1985), então com 23 anos, foi sem dúvida o personagem principal da história que se passou por trás dos microfones e, no dia seguinte, também diante das câmaras e nas manchetes dos jornais. Mas, como todo produto da mídia eletrônica, A Guerra dos Mundos foi uma produção coletiva e pelo menos outros dois autores de peso contribuíram com ele para o sucesso da obra: o escritor inglês Herbert George Wells (1866-1946), autor do romance em que se baseou o programa, e o roteirista Howard Koch (1901-1995), responsável pelo trabalho mais pesado na hora da adaptação.


Quarenta anos antes de Welles, H.G. Wells já conquistara a fama com o lançamento do romance: A Guerra dos Mundos foi publicada pela primeira vez em folhetim, na revista inglesa Pearson's Magazine, entre abril e novembro de
1897
. No ano seguinte, saiu em livro, ampliada na forma de romance, e começou a ser traduzida por todo o planeta. Cem anos depois de seu lançamento, o livro de H.G.Wells é unanimemente reconhecido como uma das obras primas que serviram de matriz para todo o desenvolvimento posterior da literatura de ficção científica. Contemporâneo do francês Júlio Verne, Wells foi o primeiro a imaginar uma invasão extraterrestre e a descrever um ser alienígena.

No final do Século XIX, quando do lançamento do livro, a possibilidade de existência de vida inteligente em Marte era seriamente considerada pela ciência, mas não havia ainda sido tratada pela literatura. Wells não somente estava a par do conhecimento científico de sua época, como também antecipou no livro algumas tecnologias que ainda povoam o imaginário sobre os ETs. um século depois: raios laser, máquinas voadoras, máquinas de guerra em forma de aranhas, robots e armas químicas. E, o mais fantástico de tudo, criou tudo isso a partir de uma Londres que ainda se movia principalmente a cavalo e era iluminada à noite com lampiões a gás.

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Howard Koch, o roteirista novato e ainda desconhecido do Mercury Theatre on the Air da CBS, recebeu a tarefa de adaptar o texto literário para o rádio. Assim como ocorreu com Welles, o sucesso de A Guerra dos Mundos também catapultou Koch para a milionária indústria do cinema, e em 1942 ele ganharia um Oscar pelo roteiro de Casablanca (cuja estatueta leiloou, um ano antes de morrer, para pagar a universidade da neta).


Mais do que uma adaptação, Koch fez uma recriação do livro, aproximando a estória - no tempo e no espaço - do cotidiano dos ouvintes e introduzindo o próprio rádio como protagonista dos acontecimentos narrados, sem desperdiçar a força dramática já presente no texto que consagrara o autor inglês.

Curiosamente, num depoimento de
1968
, o roteirista relata que várias vezes propôs a Welles desistir do texto e escolher outra obra, pois não gostou de fazer aquela adaptação. Mas a obstinação do diretor do Mercury Theatre levou A Guerra dos Mundos, que seria seu projeto favorito, até o final, sem se preocupar muito com as vontades - nem com as noites de sono - de seus subordinados na equipe, obrigados a trabalhar sem horário até satisfazer o chefe.

Como se tratava de um programa semanal, o roteiro foi todo produzido em seis dias, de terça a domingo (o roteirista, como tantos profissionais de rádio, tinha folga nas segundas). Koch conta que escrevia a lápis, e que seus manuscritos eram datilografados por uma estagiária na CBS. O script foi feito e refeito uma dezena de vezes, conforme as críticas e sugestões de Orson Welles e do produtor John Houseman a cada uma das versões apresentadas. Só foi considerado pronto um pouco antes do programa ir ao ar.

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Já está no romance a abertura genial da estória, que no rádio conservou a força e amplificou o efeito de empatia pretendido pelo autor do livro: descreve como as pessoas na terra seguiam vivendo a sua vida normal, ocupadas com seus vários afazeres, esperanças e ilusões cotidianas, "sem se darem conta de que a vida no planeta vinha sendo observada por inteligências superiores às nossas, porém tão mortais quanto somos, que nos examinavam assim como examinamos os microorganismos que povoam uma gota d'água". Nesta introdução, o roteirista apenas atualizou o presente da narrativa, transferindo "o olhar invejoso e sem simpatia dos marcianos", originalmente postado na vida inglesa do fim do século, para o contexto americano em 1938.


No final da década de
30
, o que mais os americanos mais gostavam de fazer era ouvir rádio, e é aí que o veículo entra em cena como protagonista central da estória. Já no segundo minuto da peça, somos levados a esquecer que estamos ouvindo uma obra de ficção, pois aparentemente esta foi interrompida por um boletim metereológico absolutamente verossímil. Em seguida, estamos acompanhando um programa de música ao vivo, entrecortado por boletins de notícias, que a princípio são bastante realistas e tornam-se cada vez mais freqüentes.


O uso de boletins de notícias foi uma idéia de Welles, segundo o depoimento de Koch. Mas se a introdução do rádio na estória é uma criação da equipe nova-iorquina, a notícia já representara um elemento narrativo importante no romance de H.G. Wells. Porém, de forma diferente: na invasão de Londres pelos marcianos, os personagens da estória original eram ávidos consumidores de jornais, em cujas edições extras procuravam informações para entender o caos que tomara conta "da mãe de todas as cidades" do auge do Império Britânico.

Mas em A Guerra dos Mundos de Welles, a mãe de todas as cidades agora era Nova York, umbigo do novo império, e Nova York vivia ligada no rádio. A diferença fundamental, em relação ao romance, é que nesta nova versão os personagens da estória não são apenas ouvintes de rádio - o que representaria a mera atualização dos personagens-leitor de jornal, passivos: agora, os personagens falam pelo rádio. E, mais do que falar entre si, falam diretamente aos ouvintes.

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Pode-se dizer que esta inversão, sutil e raramente notada pelos críticos, foi o que colocou o rádio como o protagonista central da estória, e em conseqüência inscreveu A Guerra dos Mundos na História real deste século. Não é por mero acaso que este se tornou o programa mais falado da História do Rádio. Ao colocar o rádio no enredo, a equipe de Welles reforçou a invasão marciana de Wells com todo o potencial dramático do meio, que na época vivia sua adolescência, com apenas dezoito anos de experiência desde a fundação da primeira emissora regular, a KDKA de Pittsburgh, também nos Estados Unidos.

Não se sabe até onde a equipe premeditou os efeitos do programa sobre o público. No depoimento, Howard Koch conta que foi dormir logo depois de ouvir a irradiação em sua casa, e que só soube do estrago que havia causado no dia seguinte, ao ler as manchetes dos jornais calmamente sentado na cadeira do barbeiro. Provavelmente, previra apenas provocar alguma empatia no público, com sua escassa experiência de seis meses em seu primeiro emprego regular.

De qualquer forma, o programa realizado a partir de seu script revelou ao mundo algumas potencialidades do rádio como meio de expressão que não haviam sido ainda claramente percebidas, enquanto o "sem fio" era pensado apenas como um suporte imperfeito para a transmissão de obras teatrais e literárias produzidas para os olhos.

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A transmissão ao vivo, no tempo real do público, característica dos meios eletrônicos, apareceu como uma das principais possibilidades expressivas utilizadas pela equipe do Mercury Theatre com maestria. Para tirar partido dela, o roteirista comprimiu o tempo dramático da história original. No romance, desde a observação, pelos astrônomos, da ocorrência de estranhas explosões no planeta Marte, lançando raios em direção à Terra, até a chegada das naves marcianas a nosso planeta, passam-se nada menos do que seis anos - o tempo calculado para a viagem.

No rádio, o percurso não demora mais do que seis minutos, tempo ocupado por uma entrevista com "o astrônomo Pearson", que desdenha a possibilidade de existir vida inteligente no planeta vermelho, e pela execução da música La Cumparsita, pela "Orquestra de Ramon Raquello", que estaria tocando "no Salão Meridian do Hotel Park Plaza".

Em conseqüência, a relação causa-efeito entre o fenômeno observado pelos astrônomos e a queda de um objeto não-identificado na terra, que no livro é explicitada pelo autor, no rádio é inferida antes pelo público, o que o leva a questionar as palavras do entrevistado. No tempo real do público, a estória se passou toda em
44
minutos, mas o tempo dramático e o tempo subjetivo em que se desdobram, a partir daí, todos os acontecimentos narrados, certamente foi o que permitiu o efeito de realidade capaz de iludir, até o desespero, uma grande parcela do público.

A ubiqüidade da transmissão e de recepção, e a portatibilidade desta última, são algumas das características da comunicação eletrônica que o rádio inaugurou e de certa forma continua utilizando de forma única. Graças a estas características, continua sendo o meio com maior penetração social - batendo a TV em volume de audiência durante
18
horas por dia - e o que goza de maior credibilidade, apesar do prestígio da imprensa e do sucesso da televisão.

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É esta mobilidade, em ambos os pólos do processo comunicativo, que permite, ocasionalmente, a ocorrência de uma fusão de contextos - o da transmissão com o da recepção - fundindo, como observou BARTHES (1984), o acontecimento com o seu relato. Este fenômeno ocorre em muitas situações corriqueiras - como na reportagem de serviço, com o trânsito, ou no estádio de futebol - e fornece à informação do rádio um argumento de autoridade difícil de igualar.

Em conseqüência, a impressão de realidade, que no audiovisual custa tanto esforço construir e se torna tão fácil de desmascarar, no rádio ocorre quase naturalmente, construída no cérebro do ouvinte com a solidez do mundo real que o envolve e que percebe mesclado com o som do receptor. O escritor William BURROUGHS
(1968)
imaginou utilizar este efeito para provocar uma "revolução eletrônica". Howard Koch e Orson Welles fizeram com ele uma guerra virtual.

Haja criatividade. Richard Pearson, o professor de astronomia que na estória do rádio é o personagem principal, sequer existia no livro. Lá, o astrônomo, chamado Ogilvy, é um personagem secundário, que cai fulminado com os raios de calor disparados pelos extraterrestres no início do romance.


O personagem principal do livro era nada menos do que um filosofo, que narra toda a estória na primeira pessoa. A substituição possivelmente foi decidida num esforço de simplificação, em parte justificável pelas características do veículo, em parte pelas características do público-alvo, na época do rádio generalista movido pelo show-business.

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A simplicidade é um imperativo do meio e de sua linguagem. Esta lei é sustentada por todos os teóricos do rádio, desde os seus primórdios, quando já começaram a notar a incompatibilidade entre as formas demasiadamente complexas e o veículo exclusivamente auditivo. Está expressa nos alemães KOLB (1931) e ARNHEIM (1936), nos franceses FUZELIER (1965) e TARDIEU (1969) , no belga Theo FLEISHMAN, que fez as primeiras normas de redação para o rádio jornalismo na Europa, e no escritor italiano Carlo Emilio GADDA, que as estabeleceu para a RAI na década de 40.

Portanto, tecnicamente, a simplificação da estória, com a substituição do filósofo pelo astrônomo, pode ter sido uma boa solução. Porém, do ponto de vista estético, houve uma inegável banalização do tema, o que certamente foi uma das razões da revolta de H.G. Wells com o uso que os americanos fizeram de sua obra. (SARRAUTE,
1976).


O escritor inglês, um humanista convicto, havia pensado A Guerra dos Mundos sobretudo como um questionamento a respeito da civilização, e especialmente do imperialismo de seu país, que na época dominava o mundo. A brutalidade dos marcianos, que se alimentavam de sangue humano, matavam sem necessidade aparente e transformavam tudo a seu alcance em cinzas, é a todo momento comparada, pelo personagem-filósofo do romance, com os genocídios praticados pelos europeus contra os povos por eles colonizados, à crueldade corrente com os animais e à arrogante destruição da natureza por parte de seus compatriotas.

Muito pouco sobrou, desta "moral da estória", na versão do rádio. Talvez a equipe de Orson Welles não fosse tão sensível a estes temas, provavelmente a empresa que pagava os seus salários também não o era, e certamente eram preocupações alheias à cultura de um império emergente, na qual o Mercury Theatre da CBS estava inserido.


À moda americana, no programa de rádio todo o mal é encarnado em uma pessoa, um psicopata com que topa o professor Pearson em sua caminhada, e que pretende aprender com os marcianos para depois dominar seus semelhantes e conquistar o mundo. A semelhança com Hitler e Stálin, na época já temidos e demonizados como virtuais inimigos do mundo livre, é mais do que evidente. No livro, este personagem também existe, mas não pensa em dominar ninguém, sua loucura é só de pensar em ser capaz de derrotar os extraterrestres.

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O rádio empobreceu A Guerra dos Mundos pela simplificação, mas também aumentou a sua força dramática. Contribuiu para isso, além do tempo real da narração, o fantástico poder de sugestão da palavra sonora e invisível. MCLUHAN (1964) observou que o rádio toca em profundidades subliminares da mente, e que as palavras desacompanhadas de imagem, como quando conversamos no escuro, ganham uma textura mais rica e mais densa.

RODRIGUES (1988) relaciona a força psicológica do rádio à voz primordial que ouvimos no útero da mãe, e BANG
(1991) atribui ao mesmo fenômeno o poder emocional da música. DE SMEDT (!992) observa que o som nos toca e nos envolve. Como BAKHTIN (1979),
salienta que percebemos o visto como algo externo ao corpo, enquanto o que ouvimos ressoa dentro de nós.

O poder de evocação da palavra já é imenso na literatura, e foi utilizado com destreza por H.G. Wells para conduzir a imaginação de seus leitores a uma ruptura da vida cotidiana pela entrada em cena de seres improváveis, superiores e hostis. No rádio, a mesma descrição do suspense de sua chegada, da perplexidade diante de máquinas incompreensíveis e do asco provocado pela aparência dos monstros sai da forma congelada da palavra escrita para tomar vida na angústia, na surpresa e no horror expressados por gargantas humanas. Neste aspecto, Koch pouco alterou a obra do escritor.

Conservando basicamente as mesmas descrições fantásticas, o programa de rádio apenas se encarregou de dar-lhes voz, acrescentando o subtexto da interpretação dos atores com Welles no papel principal. WEISS
(1992) propõe que uma mente paranóica atribui à voz desencarnada do rádio as mesmas prerrogativas atribuídas ao Deus judaico-cristão: ubiqüidade, panopticismo, onisciência e onipotência. Para BACHELARD (1949),
que equiparou a escuta do rádio ao devaneio, a ausência da imagem é a chave para penetrar no mundo interior do ouvinte.

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Em alguns momentos, o roteirista utiliza efeitos sonoros - quase sempre para ilustrar um som já referido no romance, como o tic-tac da maquinaria do observatório astronômico ou o zumbido vindo da nave marciana tombada no campo. Mas os efeitos sonoros são reduzidos, diante da complexidade da situação expressa na estória: o que não soa, no rádio, só pode ser expresso pela palavra.

Assim, na maior parte das vezes, Koch opta pela palavra, desdobrando em diálogos, entrevistas radiofônicas e boletins de notícia o que no livro é contado em monólogo pelo personagem principal. Para dar ritmo - e efeito de realidade - à narrativa, utiliza um grande número de testemunhas verossímeis e habitues do rádio, como agências de notícias, autoridades, cientistas, militares e "homens comuns".

Apenas no último terço da peça, o roteiro começa a desfazer o engano provocado nos ouvintes, pelo abandono do formato de programa musical /jornalístico adotado desde o início. Aos poucos, o rádio vai deixando de ser protagonista da estória, e a solução encontrada para tanto também é genial: a emissora é destruída pelos marcianos. Só a partir daí, com a continuidade da narrativa, o público pode se tranqüilizar com a certeza de estar lidando com ficção. Mas é provável que muitos, já em estado de pânico, não tenham se dado conta tão facilmente disto.

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A última parte do script segue um modelo mais tradicional de radiodrama. O rádio sai de cena como protagonista, e se transforma outra vez em veículo para a expressão dos personagens em seu mundo de ficção. O diálogo, agora, não é mais com o ouvinte, mas dos personagens entre si.

O comandante com o artilheiro no canhão, o aviador com a torre de comando, o professor Pearson com o psicopata e, por fim, ele só, no monólogo que conta o desfecho da estória: a morte de todos os até então invencíveis marcianos, derrotados pelas bactérias terrestres, e a retomada da vida normal no planeta.

A música utilizada, com tema místico, também muda de papel: já não interrompe a estória, mas serve de fundo para enfatizar-lhe o clima. Aqui é onde a estrutura narrativa mais se aproxima do romance, embora haja mais diálogos e outras adaptações determinadas pela diferente natureza do veículo.

A equipe de Welles foi fiel a H.G. Wells em vários aspectos e, onde não pôde ser, muitas vezes procurou soluções que o aproximassem das intenções do autor do livro. Como no caso das interrupções musicais, que criam o ritmo de respiração tão importante para a criação do suspense.

No romance, este efeito é conseguido pela intercalação de cenas da chegada dos marcianos com outras absolutamente cotidianas, como a pausa dos protagonistas para o chá das cinco, ou a descrição dos vendedores ambulantes que aproveitam a presença da multidão em torno da primeira nave para oferecer suas mercadorias.

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Em seu depoimento, Koch conta que escolheu a localidade de Grovers Mills para a descida dos marcianos apontando para o mapa de olhos fechados, e que a confirmou porque o nome soava bem (a comunidade local agradece, construiu um Museu sobre A Guerra dos Mundos e até hoje fatura com turismo graças a esta escolha aleatória).

Mas até a transferência do cenário, da região de Londres para a de Nova York, e também para um presente de quarenta anos após, segue a lógica do romance, que já procura identificação e empatia com o público. Neste ponto, a equipe do Mercury Theatre só pode ser responsabilizada por ter ido um pouco longe demais, ou por não haver se dado conta de que, no rádio, o efeito desta empatia seria totalmente diferente.

Além do tempo real e da fusão psicológica dos contextos, o autor de um script para o rádio tem que ter outro cuidado em relação à maneira como sua mensagem será recebida pelo público: o permanente zoom auditivo (CEBRIAN HERREROS,
1983
) entre o ouvir intencionado e o escutar sem atenção, que caracteriza a audição de qualquer programa, requer a reiteração permanente das principais informações, pois estas podem não ser objeto da atenção do público que se dispersa a cada momento.

A audição de rádio se caracteriza por um zapping perceptivo (FENATI) entre os estímulos sonoros que saem do receptor, e os demais estímulos auditivos, visuais, olfativos e táteis do contexto da recepção que concorrem pela atenção do ouvinte. Desta forma, a confusão provocada nos ouvintes por A Guerra dos Mundos, para ser evitada, requereria a reiteração, diversas vezes, ao longo do programa, da informação de que se tratava da adaptação de um romance.

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De nada adiantou Orson Welles explicar, no final da estória, que tudo não passara de uma brincadeira pelo tradicional Dia das Bruxas: o estrago estava feito. A tênue fronteira entre dois gêneros do discurso radiofônico, o jornalismo e a ficção, já havia sido arrombada.

Comprovou-se, então, o que teóricos da linguagem, como BAKHTIN e BARTHES procuram demonstrar há décadas: os gêneros do discurso não pertencem unicamente aos emissores, são também propriedade do público, forjados por cada cultura num diálogo social ininterrupto que se perde nas raízes do tempo. O desrespeito a esta construção coletiva leva à incomunicação ou à convulsão.

Desde então, os limites entre os diversos gêneros têm sido mais fortemente patrulhados, pelos códigos de ética e pelas legislações de radiodifusão de todos os países. Em conseqüência, A Guerra dos Mundos será sempre lembrada como uma espécie de "pecado original" da mídia.

E o roteiro assinado por Howard Koch, produzido sob a orientação do diretor Orson Welles e do produtor John Houseman, como uma autêntica obra prima, que revelou todo o poder da magia do rádio, inclusive para iludir o público, tanto em causas boas e belas, como a da arte e a do entretenimento, como em outras, mais trágicas, como a da exploração da ignorância das massas para mobilizá-las à guerra e mantê-las sob domínio.

E o roteiro assinado por Howard Koch, produzido sob a orientação do diretor Orson Welles e do produtor John Houseman, como uma autêntica obra prima, que revelou todo o poder da magia do rádio, inclusive para iludir o público, tanto em causas boas e belas, como a da arte e a do entretenimento, como em outras, mais trágicas, como a da exploração da ignorância das massas para mobilizá-las à guerra e mantê-las sob domínio.

http://www.jornalismo.ufsc.br/bancodedados/meditsch-roteiro.html